Assisti ontem um dos filmes mais descartáveis de que tenho notícia. Um Natal Mágico. Gosto muito da atriz que faz o papel principal, Mary Steenburgen. O filme foi lançado em 1985, ela ainda em início de carreira. Atuaria, depois, em filmes de melhor qualidade, mas, naquela época, creio que aceitava qualquer roteiro que aparecesse pela frente.
O enredo faz uma misturada esdrúxula. Papai Noel não tem duendes. Quem trabalha para ele são pessoas boas que morreram e viraram anjos de fazer brinquedo. De vez em quando, porém, Papai Noel dá a uma dessas pessoas a missão de ajudar alguém que precisa. Os anjos têm poderes sobrenaturais, enquanto que a magia do coitado do Papai Noel se limita a conseguir entregar todos os presentes em uma única noite. Ou seja, os subordinados são mais poderosos do que o chefe.
Mary interpreta Ginny, uma caixa de supermercado cujo marido sonhador está desempregado e quer abrir uma loja de consertar bicicleta. Eles precisam se mudar, porque moravam em uma casa da empresa, era moradia funcional. Como o marido foi demitido, precisam entregar a casa. Ele curte o Natal, ela é pé no chão demais, não consegue esquecer os problemas durante as festas. Trata-se, na verdade, da mesma história de O Feijão e o Sonho, só que Orígenes Lessa abordou o tema com uma excelência ausente no filme.
Ciente da situação difícil de Ginny, Papai Noel envia um de seus anjos, Gideon, para ajudar a família. O anjo entra em contato com Abbie, a filhinha de Ginny, e os dois entram em ação para resgatar o sentimento natalino.
Na véspera de Natal, o marido de Ginny é assassinado em um assalto. Depois de algumas reviravoltas bem bobinhas, Ginny declara:
– Eu acredito em Papai Noel.
Nesse momento, ela recebe a oportunidade que me faz gostar do filme. Aquilo que todos desejamos, com que todo mundo que já perdeu algum ente querido sonha: o tempo volta para antes da morte do marido. De repente, lá está ele, vivinho da silva. Sabendo de tudo que iria acontecer, ela muda as ações que aconteceriam no dia seguinte e impede o assassinato, ajudando o criminoso antes de ele cometer o crime.
Esse descartável me faz pensar em como deixamos escapar as boas coisas da vida. Quando o tempo volta, Ginny passa a agir de forma completamente diferente. Prepara o Natal com alegria, compra presentes, não só passa a compartilhar o sonho do marido com a loja de bicicletas, como abre mão do pouco dinheiro que tinha guardado para ajudá-lo a realizar o que queria.
Na verdade, não temos como saber o futuro. E não podemos viver o tempo todo pensando na morte. No roteiro do filme, ela impediu a tragédia quando passou a agir como deveria ter agido desde o início.
Jesus falou: “Vim para vocês terem vida em abundância”. Entendo essa vida em abundância sob a perspectiva de desfrutar das coisas boas que estão ao nosso redor, a começar pela família. Ginny havia perdido a capacidade de apreciar a felicidade de ter filhos e marido à sua volta, de celebrar isso a cada dia. Muitas vezes acontece conosco. Tão imersos em problemas, acabamos nos esquecendo do essencial, dessa vida em abundância que não tem nada a ver com abundância de recursos materiais. Claro que dinheiro ajuda muito a poder curtir a vida, mas não é a essência.
Na manhã em que acorda depois que o marido reviveu, Ginny está animada, feliz, conversando com os filhos. Nada mudou. Ela continua caixa do supermercado, ele continua desempregado, eles ainda terão que se mudar no dia seguinte. Só uma coisa mudou: os olhos dela foram abertos para o que é importante, para o que ela tem de mais precioso, para aquilo que não quer perder de jeito nenhum.
Sabe aquele dia em que você está com vontade de não pensar em nada e de ver alguma coisa com final feliz, mesmo que improvável? Vá lá no Google, digite Natal Mágico Mary Steenburgen e assista. Garanto que vai se divertir, nem que seja rindo com a péssima qualidade do filme. Mas, quando acabar de rir, pense em como é importante valorizar as pessoas que amamos, apoiar os sonhos delas, trabalhar para que sejam felizes.