Deve ter sido em 1964 ou 1965, ainda na capelinha de madeira na 412 Sul.
Naquela era pré-praçadealimentação, a Escola Dominical começava e acabava cedo, porque as mulheres tinham que ir para casa fazer o almoço. Muitas, como minha tia Nair, que tinha muitos filhos, nem podiam ir de manhã à igreja – afinal, era necessário até depenar galinha. Nada de congelados, nem de microondas.
Mas, naquele domingo, ninguém teve pressa de ir embora. Surgiu do nada um missionário! Foi nos visitar. No final da Escola Dominical, todo mundo voltou para o templo para ouvir o testemunho dele. Crianças sentadinhas nas primeiras filas, em cadeirinhas.
Nenhuma criança, jamais, deveria ouvir a história que aquele homem contou. Sofrera torturas horríveis, e as descreveu (passei dias sem dormir direito, lembrando daquilo) com detalhes. Ele gritava, gesticulava, andava de um lado para outro. A gente não conseguia desgrudar os olhos dele. Dizia que tudo acontecera em algum país da África.
Mulheres choravam, homens tentavam não chorar e as crianças… se torciam de pavor.
Por fim, ele bradou:
– Quando me precatei (O que será que vem a ser isso????????), eu estava agarrado nas grades, gritando!!!!!!!!!!!!
E nós quase gritamos também.
Reverendo Traxler, extremamente comovido, propôs levantar uma oferta naquele momento para ajudar o missionário tão sofrido. Nossa igreja já era generosa desde aquele tempo, e foi uma oferta substancial. Papai, muito escolado, disse para o pastor não entregar todo o dinheiro naquela hora, para tentar verificar a procedência do tal missionário. O pastor ficou bravo, achou que não era certo duvidar daquele homem que sofrera tanto pelo evangelho. Além de entregar o dinheiro, convidou-o para pregar no culto da noite. Algum membro da igreja levou o homem até a pensão onde estava hospedado.
Papai e dr. Daso resolveram tomar a frente e ir conversar com o missionário depois do almoço. Marcaram um horário e se encontraram na pensão. Você estava lá? Nem o “missionário”, claro. Nunca mais foi visto. Nem ele, nem o dinheiro.
Mas valeu a pena. A congregação, naquela manhã, pagou para termos uma história a mais para contar. De perseguição, só restaram os pesadelos que perseguiram os ouvintes durante anos, lembrando das torturas que o homem inventou.
Eu me lembro bem dessa historia. Tambem fiquei impressionado com os detalhes da tortura e depois com a “revelação” da fraude.