Inesquecível. Futebol das tardes de sábado no gramado da igreja. Durante muitos anos, sob sol ou chuva, calor ou frio, lá estavam eles, os bravos jogadores de futebol da Igreja Metodista da Asa Sul. Almoçavam às pressas, para chegar cedo e pegar a “primeira pelada”. A melhor de todas. E porque quem pegava a primeira tinha tempo para jogar de novo, mais tarde.
Nasceu como incentivo ao trabalho. Foi assim. Quando foi feito o projeto para nossas instalações definitivas, a Igreja Metodista recebia contribuição substancial da igreja dos Estados Unidos. Então, nosso projeto foi grandioso. O que temos hoje era apenas o edifício para ensino. O templo ficaria onde temos o gramado. Design moderno, adequado à cidade do futuro.
Obras iniciadas, prédio crescendo rapidamente… a igreja dos EUA parou da mandar ofertas. Isso mesmo. Lá ficou, na igrejinha de madeira, uma comunidade pequena com a responsabilidade de concluir a obra imensa, muito acima de sua capacidade financeira. O fim da história todos sabem: estamos lá. Deixamos o templo para algum dia, o que temos hoje é mais do que suficiente.
Colocar a obra começada num ponto em que pudéssemos passar nossas reuniões para o prédio novo foi um esforço gigantesco. Uma das providências foi convocar a ala masculina para trabalhar nas tardes de sábado. Trabalhar mesmo. Pegar no cimento, na pá. Eles fizeram, entre outras coisas, o piso de toda a parte superior. Pensa na dificuldade. Nenhum deles sabia fazer o serviço. Arrumaram algum mestre de obras e fizeram assim mesmo! Lembro muito bem de meu pai, que durante a semana autorizava ou nega empréstimos do Banco do Brasil para empresários brasilienses, abaixado, com uma espátula, alisando o piso vermelho.
Bem, para motivar, principalmente os jovens, uma ideia brilhante: depois de trabalhar por algumas horas, um jogo de futebol no lugar onde hoje temos grama, e, na época, era apenas terra. Nasceu uma lenda. O futebol na frente da igreja nas tardes de sábado.
O trabalho braçal acabou, mas o futebol continuou. E como continuou! Virou programa familiar. Vinham mães, esposas, filhas, namoradas, noivas, sogras, enfim, as mulheres todas. A gente tinha “arquibancada” – uma porção de cadeiras que eles colocavam na beirada do campo. As tardes de sábado eram passadas ali. Homens jogando futebol, mulheres conversando, rindo e torcendo.
O tempo foi passando, alguns parando de jogar (menos papai e seu Osvaldo), os que eram crianças começando. E a animação do sábado continuava. Tinha cantina, Quissuco (como é que se escreve isso?), bolos, sanduíches. Quando havia algum projeto, o lanche era vendido. Caso contrário, era de graça mesmo.
Chegou o tempo do Dream Team – a geração da qual Henrique e Sérgio fazem parte. Não vou relacionar outros nomes, para não cometer injustiças. Mas o fato é que eles eram invencíveis no nosso gramado. Conheciam cada morrinho, cada buraquinho. Afinal, cresceram jogando ali. Quantas aventuras aconteceram! Brigas inesquecíveis. Para lembrar uma só, um cara deu um chute no Daniel Teixeira. Um outro, que não vou citar o nome, só vou dizer que é bem grandão e hoje é pastor, viu e veio soltando fumaça. Papai percebeu que ele pretendia destruir o visitante que chutara o Dani, e resolveu entrar na frente do hoje pastor. Eu pensei: “Caramba, ele vai derrubar meu pai!”. Mas ele parou, bufando de raiva. Papai o colocou de castigo um pouquinho, depois mandou voltar pro jogo. Era assim, a briga começava, virava o caos, depois acabava. Como nas famílias. Afinal, éramos e somos família.
E havia torneios, com troféus para os vencedores. Times uniformizados, torcida animadíssima. Havia a TUM: Torcida Uniformizada Metodista, que cantava “TUM, TUM, bate coração!”. Lembro especificamente de Cristina, Claudinha e Sílvia fazendo parte da TUM.
Durante a semana, seu Osvaldo molhava religiosamente o gramado, que era verde inclusive na época da maior seca do ano. Aliás, falar no futebol sem falar do seu Osvaldo é impossível. Nas tardes de sábado o mundo podia cair, mas ele estava jogando. No dia em que passou mal dentro do campo foi um reboliço! Nosso herói maior estava caído. Mas ele voltou, e ainda jogou durante vários anos.
Algumas cenas eu não esqueço. O dia em que seu Silas fez um gol e André, para comemorar, pegou-o, literalmente no colo. Ou o Henrique gripado, jogando na chuva e papai dentro do carro fazendo ameaças quanto ao que ia fazer à noite com ele, mas sem seguir o conselho da mamãe e mandar o Henrique simplesmente sair do jogo. Uma grávida (esqueci o nome – é da família Rosa) que levou uma bolada na barriga. Seu Ari, que sempre foi contra o futebol, chegar para levar o Léo para o jogo. Tia Sarah brigando com qualquer um que se aproximava dos filhos dela.
Há quem critique. Eu critico quem critica. Penso que toda igreja deveria ter tardes tão saudáveis quanto aquelas para sua juventude. Por que as igrejas pensam que são apenas comunidades religiosas? Precisamos ser famílias, ter atividades sociais conjuntas. Nas tardes de sábado surgiam ideias para programas nas noites de sábado. Casamentos foram cultivados naquele gramado. Famílias nasceram dali. Havia muito amor e alegria.
Lembro bem da minha avó, mãe do meu pai, à beira do campo. Jairson Pinto era goleiro do time adversário ao do meu pai. Papai era artilheiro. Ficava ali, por perto do gol. Décio Miranda fazia as jogadas e, muito generoso, deixava seu Biléo concluir. E Jairson, perdoe-me, era bem frangueiro. Certo dia, algum dos muitos atleticanos presentes, empolgados com os gols do papai, disse:
– Biléo devia ir jogar no Atlético!
Vovó Rosa, inabalável, girando os dedinhos sobre o colo, como fazia o tempo todo, declarou:
– É, mas temos que levar o Jairson para o Cruzeiro.
Tenho que repetir: Que saudade!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
O futebol durou muitos anos. Depois, perdeu aquele brilho, deixou de ser ponto de encontro de toda a igreja. Até que, como tudo nesta vida, chegou ao fim. Não penso que o passado era melhor. Aceito as mudanças com muita naturalidade. Acabou porque tinha que acabar, porque chegou a hora de outras coisas. Mas, que era bom a valer e que me alegro por ter vivido essas coisas, ah, isso era!
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Minha prima e talvez minha escritora preferida,
Obrigado por me fazer lembrar desses momentos que foram tão especial.
Nosso time era mesmo imbatível mesmo com minha presença.
Me lembro da nossa escalação:
Luiz Claudio – Goleiro
Sergio Mongol – Pastor
Natanael – Lateral
Claudio – Lateral
Beto
Toninho
Ceceu
Daniel
Acho que faltou alguém, por favor completem a lista.
E tinha Tio Biléo que fazia estudo bíblico com nosso time antes dos jogos e se alguém falasse algum palavrão no jogo……. na semana seguinte o estudo demorava mais que um jogo.
Obrigado Tio pela sua dedicação e apoio a todos nós sempre. Obrigado Cláudia pelas boas lembranças.
Obrigada, primo, pelos elogios…
Lógico que faltou alguém: HENRIQUE O CRAQUE DO TIME – desculpe
O futebol não tinha acabado. Continuou pelos pés de outros personagens. Meus filhos e sobrinhos chegaram semana passada em casa e com os olhos marejados, disseram que o Baby deu a triste notícia. O futebol acabou. Não quis dizer o motivo. Sugeri que arrumassem outro lugar e Filipe disse: outro lugar é fácil arrumar, mas o que significa aquele campo, não. Chorei. Além das memórias do avô dele, tinham ali o compromisso do evangelismo. Capitaneados pelo Baby, todos os sábados cedo, oravam, liam a bíblia e compartilhavam suas experiências com Deus, áqueles que chegavam pra jogar . E muitos, pode ter certeza, conheceram Jesus, naquelas manhãs. Triste.
Triste mesmo.